quarta-feira, 30 de julho de 2008

"É o petróleo, estúpido!"

"É o petróleo, estúpido!"
Por Noam Chomsky*



Embedded  link removed by  webmail. http://www.envolverde.com.br/fotos/50183.jpg O acordo que se desenha entre o ministério iraquiano do Petróleo e quatro companhias petrolíferas ocidentais levanta questões delicadas quanto aos motivos da invasão e da ocupação do Iraque pelos Estados Unidos. Estas questões deviam ser levantadas pelos candidatos às eleições presidenciais e discutidas seriamente nos Estados Unidos, assim como no Iraque ocupado. A análise é de Noam Chomsky.

O acordo que se perfila entre o ministério iraquiano do petróleo e quatro companhias petrolíferas ocidentais levanta questões delicadas quanto aos motivos da invasão e da ocupação do Iraque pelos Estados Unidos. Estas questões deviam ser levantadas pelos candidatos às eleições presidenciais e discutidas seriamente nos Estados Unidos, assim como no Iraque ocupado, onde parece que a população desempenha apenas um papel menor - se é que desempenha - na definição do futuro do país.

As negociações relativas à renovação das concessões petrolíferas, perdidas aquando das nacionalizações que permitiram aos países produtores recuperar o controle dos seus próprios recursos, estão bem encaminhadas para serem entregues à Exxon Mobil, Shell, Total e BP. Estes parceiros originais da Companhia Petrolífera Iraquiana são acompanhados agora pela Chevron e por outras companhias petrolíferas de menor dimensão. Estes contratos negociados sem concorrência, aparentemente redigidos pelas companhias petrolíferas com a ajuda dos oficiais americanos, foram preferidos às ofertas formuladas por mais de 40 outras companhias, especialmente chinesas, indianas e russas.

"O mundo árabe e parte das população americana suspeitavam que os Estados Unidos tinham entrado em guerra precisamente para proteger a riqueza petrolífera que estes contratos procuram garantir" escreveu Andrew E. Kramer no New York Times. A referência de Kramer a uma suspeita é um eufemismo. É além disso mais provável que a ocupação militar tenha ela própria impulsionado a restauração de uma odiada Companhia Petrolífera Iraquiana, instalada na época da dominação britânica afim de "se alimentar com a riqueza do Iraque no quadro de um acordo notoriamente desequilibrado", como escreveu Seamus Milne no Guardian.

Os últimos relatórios evocam atrasos na apreciação das ofertas. O essencial desenrola-se sob o signo do segredo e não seria surpreendente que surgissem novos escândalos.

A necessidade dificilmente poderia ser mais premente. O Iraque possui provavelmente a segunda reserva mundial de petróleo, que se caracteriza além disso por baixos custos de extracção: sem permafrost [1], nem areias betuminosas a transpor, nem perfuração em águas profundas para empreender. Para os planificadores americanos, é imperioso que o Iraque permaneça, na medida do possível, sob o controlo dos Estados Unidos, como um Estado cliente dócil apropriado para acolher bases militares em pleno coração da primeira reserva energética mundial. Que esses eram os objetivos fundamentais da invasão foi sempre claro, apesar da cortina de fumaça de sucessivos pretextos: Armas de destruição maciça, ligações de Saddam com a Al-Qaeda, promoção da democracia e da guerra contra o terrorismo - o qual se desenvolveu radicalmente com a própria invasão, como era previsível.

Em novembro último, estas preocupações tornaram-se explícitas quando o Presidente Bush e o Primeiro ministro iraquiano, Nouri Al-Maliki, assinaram uma "Declaração de princípio", com total desprezo pelas prerrogativas do Congresso americano e do Parlamento iraquiano, assim como da opinião das respectivas populações.

Esta Declaração permite uma presença militar indefinida no Iraque, em coerência com a edificação em curso de gigantescas bases aéreas em todo o país, e da "embaixada" em Bagdade, uma cidade na cidade, sem qualquer semelhança em todo o mundo. Tudo isto não é construído para ser em seguida abandonado.

A declaração encobre igualmente uma descarada afirmação quanto à exploração dos recursos do Iraque. Nela se afirma que a economia iraquiana, isto é os seus recursos petrolíferos, deve ser aberta aos investimentos estrangeiros, "especialmente americanos". Isto é quase como um anúncio de que vos invadimos para controlar o vosso país e dispor de um acesso privilegiado aos vossos recursos.

A seriedade destas intenções foi sublinhada pelo "signing statement"[2] do Presidente Bush declarando que rejeitará qualquer texto do Congresso suscetível de restringir o financiamento necessário para permitir "o estabelecimento de qualquer instalação ou base militar necessária para o abastecimento das Forças Americanas que estão permanentemente estacionadas no Iraque" ou o "controle dos recursos petrolíferos iraquianos pelos Estados Unidos".

O recurso extensivo aos "signing statements", que permitem ao poder executivo estender o seu poder, constitui outra das inovações práticas da administração Bush, condenada pela American Bar Association (Associação de advogados americanos) como contrária ao Estado de direito e à separação constitucional dos poderes".

Sem surpresa, a declaração provocou imediatos protestos no Iraque, entre os quais dos sindicatos iraquianos, que sobrevivem apesar das duras leis anti-sindicais, instituídas por Saddam e mantidas pelo ocupante.

Segundo a propaganda de Washington, é o Irã que ameaça a dominação americana no Iraque. Os problemas americanos no Iraque são todos imputados ao Irã. A Secretária de Estado Condoleeza Rice sugere uma solução simples: "as forças estrangeiras" e os "exércitos estrangeiros" deveriam ser retirados do Iraque - os do Irã, não os nossos.

O confronto quanto ao programa nuclear iraniano reforça ainda as tensões. A política de "mudança do regime" conduzida pela administração Bush a respeito do Irã é acompanhada da ameaça do recurso à força (neste ponto Bush não é contraditado por qualquer dos dois candidatos à sua sucessão). Esta política igualmente legitima o terrorismo em território iraniano. A maioria dos americanos prefere a via diplomática e opõe-se ao uso da força, mas a opinião pública é em grande parte irrelevante, e não só neste caso.

Uma ironia é que o Iraque está se transformando pouco a pouco num condomínio americano-iraniano. O governo de Maliki é a componente da sociedade iraquiana sustentada ativamente pelo Irã. O chamado exército iraquiano - exactamente uma milícia entre outras - é largamente constituído pela brigada Badr, treinada no Irã e que foi constituída do lado iraniano durante a guerra Irã-Iraque.

Nir Rosen, um dos correspondentes mais astuciosos lá presentes e profundo conhecedor da região, salienta que o alvo principal das operações militares conduzidas conjuntamente pelos Estados Unidos e por Maliki, Moqtada Al-Sadr, já não recolhe os favores do Irã: independente e beneficiando de apoio popular, esta facção é perigosa para este país.

O Irã, segundo Rosen, "apoiou claramente o Primeiro ministro Maliki e o governo iraquiano, na altura do recente conflito em Bassra, contra o que eles descrevem como 'os grupos armados ilegais' (do exército Mahdi de Moqtada)", "o que não é surpreendente tendo em conta que o seu principal testa de ferro no Iraque, o Conselho Supremo Islâmico Iraquiano, apoio essencial do governo Maliki, domina o Estado iraquiano."

"Não há guerra por procuração no Iraque", conclui Rosen, "porque os Estados Unidos e o Irã partilham o mesmo testa de ferro".

Podemos presumir que Teerã gosta de ver os Estados Unidos instalarem-se e apoiarem um governo iraquiano receptivo à sua influência. Para o povo iraquiano porém este governo constitui um verdadeiro desastre e vai provavelmente prejudicá-lo mais.

Em termos de relações externas, Steven Simon sublinha que a estratégia contra-insurreciona l atual dos Estados Unidos "alimenta as três ameaças que pesam tradicionalmente na estabilidade dos Estados do Médio Oriente: o tribalismo, os senhores da guerra e o sectarismo." Isto poderia desembocar no surgimento de um "Estado forte e centralizado, dirigido por uma junta militar que poderia assemelhar-se" ao regime de Saddam. Se Washington conseguir os seus fins, então as suas ações estão justificadas. Os atos de Vladimir Putin, quando conseguiu pacificar a Tchechênia de uma maneira bem mais convincente que o general David Petraeus no Iraque, suscitam contudo comentários de outra natureza. Mas isto são eles, nós somos os Estados Unidos. Os critérios são portanto totalmente diferentes.

Nos Estados Unidos, os Democratas são reduzidos ao silêncio pelo pretenso sucesso da ofensiva militar americana no Iraque. Mas o seu silêncio trai a ausência de oposição de princípio à guerra. Segundo a sua forma de ver o mundo, o fato de se alcançarem os fins justifica a guerra e a ocupação. Os apetitosos contratos petrolíferos são obtidos com a conquista do território.

De fato, a invasão no seu conjunto constitui um crime de guerra - crime internacional supremo, que difere dos outros crimes de guerra porque gera, segundo os próprios termos do julgamento de Nuremberg, todo o mal causado em seguida. Isto está entre os assuntos impossíveis de abordar na campanha presidencial ou em qualquer outro quadro. Porque estamos no Iraque? Qual é a nossa dívida para com os iraquianos por ter destruído o seu país? A maioria do povo americano deseja a retirada das tropas americanas do Iraque. A sua voz tem importância?

* Publicado em Khaleej Times a 8 de Julho de 2008, disponível em chomsky.info. Tradução de Carlos Santos (esquerda.net)

[1] Permafrost - tipo de solo das regiões árticas, permanentemente congelado.

[2] Ato pelo qual o Presidente dos Estados Unidos modifica o significado de um texto de lei.

(Envolverde/ Agência Carta Maior)


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Obama, o príncipe do engodo

por John Pilger [*]

Em 12 de Julho, The Times dedicou duas páginas ao Afeganistão. Foi sobretudo acerca do calor. O repórter, Magnus Linklater, descreveu em pormenor o seu desconforto e como teve necessidade de ser borrifado com água fria. Ele também descreveu o "grande drama" e a "rotina meticulosamente praticada" de evacuar um outro jornalista demasiado calorento. Para as equipes de resgate da US Marine, escreveu Linklater, "salvar uma vida tem prioridade sobre a segurança [deles]". Junto a esta peça havia uma reportagem cujo parágrafo final mencionava que "47 civis, a maior parte deles mulheres e crianças, foram mortos quando um avião da US Air Force bombardeou domingo uma festa de casamento no leste do Afeganistão".

Carnificinas nesta escala são comuns, e na maioria das vezes permanecem desconhecidas para o público britânico. Entrevistei uma mulher que havia perdido oito membros da sua família, incluindo seis filhos. Foi lançada uma bomba de 500 libras [227 kg] US Mk82 sobre a sua casa construída com barro, pedras e palha. Não havia "inimigo" nas proximidades. Entrevistei um director de escola cuja casa desapareceu numa bola de fogo provocada por outra bomba de "precisão". Lá dentro estava nove pessoas – sua esposa, seus quatro filhos, seu irmão e sua esposa, e sua irmã e seu marido. Nenhum destes assassínios em massa foi notícia. Tal como Harold Pinter escreveu a respeito de tais crimes: "Nada chegou a acontecer. Mesmo quando estava a acontecer isto não estava acontecer. Não importava. Não tinha interesse".

Um total de 64 civis foram bombardeados até à morte enquanto o homem de The Times estava inconfortável. A maior parte eram convidados na festa de casamento. As festas de casamento são uma especialidade da "coligação". Pelo menos quatro delas foram arrasadas — nas províncias de Mazar, Khost, Uruzgan e Nagarhar. Muitos dos pormenores, incluindo os nomes das vítimas, foram compilados por um professor de New Hampshire, Marc Harold, cujo Projecto Memorial de Vítimas Afegãs é um trabalho meticuloso de jornalismo que envergonha aqueles que são pagos para manterem o registo em dia e relataram quase tudo acerca da Guerra Afegã através dos serviços de relações públicas dos militares britânicos e americanos.

Os EUA e seus aliados estão a lançar números recorde de bombas sobre o Afeganistão. Isto não é noticiado. No primeiro semestre deste ano, foram lançadas 1853 bombas: mais do que todas as bombas de 2006 e a na maior parte de 2007. "As bombas utilizadas mais frequentemente", relata o Air Force Times, "são as de 500 libras e 2000 libras [907 kg] conduzidas por satélite...". Sem esta carnificina unilateral, o ressurgimento dos Taliban poderia não ter acontecido. Mesmo Hamid Karzai, fantoche americano e britânico, disse isso. A presença e a agressão de estrangeiros quase uniu a resistência que agora inclui antigos senhores da guerra outrora na folha de pagamento da CIA.

Este escândalo seria a manchete dos noticiários, se não fosse aquilo que o antigo porta-voz de George W. Bush, Scott McClellan, denominou de "activadores da cumplicidade" ("complicit enablers") — jornalistas que funcionam como pouco mais de alto-falantes oficiais. Tendo declarado que o Afeganistão era uma "boa guerra", tais activadores da cumplicidade estão agora a incensar Barack Obama quando ele se passeia pelas festas sanguinárias no Afeganistão e no Iraque. O que eles nunca dizem é que Obama é um terrorista (bomber).

No New York Times de 14 de Julho, num artigo destinado a aparentar como que o fim da guerra no Iraque, Obama exigiu mais guerra no Afeganistão e, com efeito, uma invasão do Paquistão. Ele quer mais tropas de combate, mais helicópteros, mais bombas. Bush pode estar de saída, mas os republicanos construíram uma máquina ideológica que transcende a perda do pode eleitoral — porque seus colaboradores são, como disse sucintamente o escritor americano Mike Whitney, democratas do "engodo falso" ("bait-and-switch"), dos quais Obama é o príncipe.

Aqueles que escrevem de Obama que "no que se refere a assuntos internacionais, ele constituirá uma enorme melhoria sobre Bush" demonstram a mesma ingenuidade deliberada que apoiou o "engodo falso" de Bill Clinton – de Tony Blair. Com Blair, escreveu Hugo Young no fim de 1997, "a ideologia rendeu-se inteiramente a 'valores'... não há vacas sagradas [e] nenhuns limites fossilizados para o campo sobre o qual a mente possa estender-se na busca de uma Grã-Bretanha melhor...".

Onze anos e cinco guerras depois, pelo menos um milhão de pessoas está morta. Barack Obama é o Blair americano. É irrelevante que ele seja um operador calmo e um homem negro. Ele faz parte de uma sistema duradouro e desenfreado cujos chefes de banda e grupos de apoio nunca vêem, ou querem ver, as consequências de bombas de 500 libras despejadas erradamente sobre casas de barro, pedras e palha.

24/Julho/2008

O original encontra-se em http://www.johnpilg er.com/page. asp?partid= 497

Este artigo encontra-se em http://resistir. info/ .


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Um outro mundo é possível. um outro brasil é necessário!

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