A chama viva e acesa da nossa expressão
só será popular se popularizarmos esse instrumento junto com o sentido
de classe que ele possui
30/11/2009
Roberta Traspadini
Estamos em festa. Em meio às várias amarras,
opressões, condicionamentos burgueses dos donos do capital, uma editora
consegue dar vida a sujeitos revolucionários e suas obras clássicas.
E o faz porque o seu processo não está centrado na
maximização dos lucros. Sua base de sustentação coletiva, solidária é a
da maximização do conhecimento a partir da democratização das
históricas idéias socialistas.
Ideias revolucionarias daqueles que, ao longo do seu
caminhar histórico, defendem um mundo com os olhos, corpos, mentes,
processos e sentidos de uma classe que, ao se ver como trabalhadora,
protagoniza, em cada época, o caminho de construção sobre o seu destino.
Em plena era dos falsos discursos sobre o fim da
história, o fim do trabalho, o fim do sujeito coletivo politizado e o
fim da luta de classes, o que essa expressiva aniversariante popular
nos convida a comemorar, é o grande pequeno gesto vitorioso de uma
classe que não se rende à violenta e cotidiana opressão do capital.
Nestes 10 anos esta aniversariante expressa de forma
popular um conteúdo que tem a memória como instrumento vigoroso da
história.
É a história em movimento, cuja contradição
manifesta ao longo de períodos específicos, revela o projeto de
superação da alienação, do fetiche, da opressão e dominação, vigentes
como suposto apogeu reinante e absoluto do capital.
Por que em plena era do gelo, em que o esfriamento
das relações entre o humano e os demais seres, se choca com o
aquecimento global, tal aniversario é tão importante?
Porque retrata o fruto de uma experiência que não se esgota no conjuntural, nem nos ensinamentos puramente mercantis do capital.
É importante porque estes 10 anos retratam a
convicção de que outro mundo é necessariamente possível e tem uma
identidade concreta: aquela em que caibam outros mundos, cujo caráter é
o do fim de qualquer opressão-exploraçã o de uma classe sobre a outra.
Mas que sabe que para superar é preciso, organizar, reunir, reconhecer,
refazer o novo, com base na histórica memória da luta de classes.
O popular, quando deixado ao capital, é diminuído em
seu conteúdo. É tomado como sinônimo de bárbaro, inculto, pobre, de
pouco valor, uma vez que a dominância é a do dinheiro sobre o ser, cujo
único valor que tem sentido, é o da troca. Uma troca que produz a
riqueza mercantil com base na apropriação privada da vida, do sentido
do trabalho, do conhecimento e da produção de uma mais valia
capitalista.
Em contrapartida, o popular quando manifesto pelos
próprios trabalhadores, é potencializado para romper com o que fomos
educados para ler, e instituir uma nova leitura sobre si mesmo e do
processo histórico ao longo de nosso caminhar. A isso se da o nome de
popular socialista.
O popular socialista é um popular com sentido de
classe, que dá o máximo valor à outra dimensão da riqueza: a do valor
de uso, em um estar sendo do ser social que se vê em coletividade,
cooperação, solidariedade com os demais seres.
Vivemos esta tensão entre o sentido do popular
burguês, e a expressão popular socialista: No molde burguês, a práxis é
alienada, a partir da separação entre o trabalho e sua realização. No
processo socialista a práxis é reflexão para a ação emancipadora. A
aquela que, ao aprender porque está sendo condicionada, revê dita
condição humana e potencializa o caminhar projetado sobre seu próprio
destino.
O popular emancipador expressa e necessidade de
socializar com o maior número possível de sujeitos políticos, em vários
lugares ao mesmo tempo, o que outros tantos pensaram, pensam e pensarão
junto conosco.
O popular deixa de ser sem saber, e passa a saber no
estudo coletivo, quem produziu, na dominação violenta, saberes
aparentemente maiores e menores.
O popular revolucionário tem o desafio de expressar este duplo sentido de classe.
Deve ser capaz de expressar o sentido da classe
dominante burguesa que trata o popular como ferramenta para alienar o
maior número possível de sujeitos. Manifesta esta alienação em livros
de auto-ajuda que não retomam nem a história, nem o sujeito coletivo da
história. Colocam para o individuo a superação divina como um desígnio
próprio ou de Deus.
Mas no mesmo espaço, contexto, em meio à estas
produções hegemônicas, coexistem outros processos com outros sentidos.
O popular neste outro processo, dentro do mesmo contexto, ganha outra
magnitude e levanta outras vozes. A da produção coletiva de um saber
que não está sedimentado somente naquilo que vivemos, mas
essencialmente na história que pode consolidar, para além do que temos,
o que queremos.
A expressão popular enquanto editora dos movimentos
sociais, dos sujeitos políticos engajados e da intelectualidade
orgânica é um instrumento da classe, para a classe e se contrapõe
ideologicamente aos instrumentos da classe dominante.
Nossa editora, evidencia no seu processo de
estruturação do conhecimento, de seleção e veiculação dos materiais,
que ainda é possível valorizar o uso a ser dado pelo humano, sem
mercantilizá- lo através da lógica dominante do valor de troca.
Quais são os principais ensinamentos que ficam deste
comemoração coletiva que, esperamos, permaneça com sua vela acesa, nas
próximas décadas?
1.A importância da identidade da classe, do gênero e
da etnia relacionados ao sentido do trabalho, e da concepção real de
emancipação do humano, tanto através do conhecimento, quanto na
essência mesma da produção do saber.
2.A importância de conhecermos a história para nos
reconhecermos no processo histórico de produção tanto do mundo que se
tem, quanto do mundo que - se compreendido, coletivizado, cooperado -,
pode ser superado para o que se quer, enquanto classe.
3.A importância de unificar o que o capital separou:
o conhecimento popular-conheciment o científico; o saber popular e o
saber sistematizado; a produção coletiva do conhecimento, que no âmbito
revolucionário, não pode ser separada de seu contexto e de sua reflexa
ação.
4.A importância da democratização não só do
conhecimento histórico da classe trabalhadora que, com os pés no chão
produz para si, a complexa síntese da história dominante sob a qual
levanta sua própria história, cuja raiz é a luta de classes.
5.A importância do grito, ora silencioso, ora
escandaloso de que se o conhecimento liberta, ele precisa primeiro,
clamar o fim da célula orgânica que o aprisiona: a propriedade privada
dos fatores e meios de produção, da vida, do sentido do trabalho e do
conhecimento.
6.A importância da aprendizagem, cuja linguagem vai
sendo superada a partir de uma disciplina militante que não se convence
com o histórico destino que traçado por outros para sua vida: a da
invisibilidade social, moral, econômica e cultural.
7.A importância da união, no conhecimento que
liberta, da classe que vive do trabalho e que para retomar o sentido do
mesmo, necessita estar unida nos vínculos que a fragmentou, diminuiu em
seu potencial de ser mais: a unidade de classe rumo à consolidação de
um projeto popular socialista.
O que está em jogo neste aniversário, não é o logro
comercial de ser diferente em meio ao homogêneo processo de reprodução
ampliada do capital.
O que está em jogo, neste e em muitos outros
aniversários que virão é se, enquanto classe, poderemos juntos
continuar reunindo, revendo, resignificando, aquilo que o capital
insiste em explorar.
A chama viva e acesa da nossa expressão só será
popular se popularizarmos esse instrumento junto com o sentido de
classe que ele possui. Ao ter acesso aos livros da expressão, nos
deparamos com um conhecimento que está para além dele e de nós: o da
classe em si e para si. Classe trabalhadora, protagonista tanto do
projeto que a aprisiona, quanto do que a possivelmente a libertará.
Com a expressão popular comemoramos uma vitória como
classe: a de permanecermos convictos em nossos processos de formação,
articulação e luta enquanto que classe que sabe que para viver o que
quer, necessita conhecer para destruir o que não quer. Necessita se
expressar de forma popular, com sentido de classe, e ir muito além do
capital.
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