quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A Folha quer o fim da TV Brasil

Por Marcelo Salles

A Folha quer o fim da TV Brasil. Em editorial publicado hoje argumenta
que a audiência é baixa, que sua criação não foi um ato democrático
(porque nasceu de um decreto) e que gasta, por ano, 350 milhões de
reais do dinheiro do contribuinte. Por isso, encerra o texto da
seguinte forma: “Os vícios de origem e o retumbante fracasso de
audiência recomendam que a TV seja fechada – antes que se desperdice
mais dinheiro do contribuinte” (veja a íntegra abaixo). Eu tenho
críticas à TV Brasil, mas nenhuma delas tem a ver com a opinião da
Folha. Aliás, seria bom a gente perguntar: a quem serve a Folha? No
cabeçalho se diz que é um jornal a serviço do Brasil, o que soa como
piada pra quem conhece minimamente a história da imprensa do país. Pra
não ir muito longe, basta dizer que o jornalão emprestou veículos para
a ditadura. Mas talvez isso seja uma questão de ponto de vista:
estavam, diria o jornal da “ditabranda”, a serviço do Brasil contra a
Comunidade Comunista, que pretendia se instalar no governo federal.
Voltando. A TV Brasil é uma tentativa de cumprir a Constituição, que
determina a complementariedade entre os serviços privado, público e
estatal. Hoje só existe o privado e, tenho certeza, isto tem a ver com
o lixo jogado no ar todos os dias. Sim, amigos, a televisão privada
brasileira é um lixo. Não presta. Raríssimos são os programas
razoáveis. Na Globo, por exemplo, nada menos que metade da programação
entre 12h e 24h é de novela. E de uma novela que dissemina os piores
valores morais que existem. Posso concordar que existem erros graves
na TV Brasil, e o primeiro deles foi a entrega dos cargos de direção
para jornalistas oriundos das corporações de mídia. Com isso o governo
indicou uma conciliação, não uma mudança substancial no jeito de fazer
jornalismo. Assim, não é à toa que muito do conteúdo veiculado pela TV
Brasil, sobretudo nos telejornais, tem sido muito parecido com aquele
das corporações privadas (ver a carta do Mário Augusto Jakobskind à
Ouvidoria da emissora, aqui no Fazendo Media). Por outro lado, não dá
pra dizer que é tudo igual. Se pegarmos a programação como um todo,
veremos a existência de iniciativas que jamais teriam vez no atual
sistema privado de televisão. É o caso dos documentários, que dão voz
e vez aos segmentos da sociedade que só aparecem na mídia corporativa
como bandidos.

Por isso, o governo precisa se manter firme diante da pressão da
Folha. E contra-atacar. Pra começar, coloque em pauta a mudança na lei
que criminaliza as rádios comunitárias e determine que sua Polícia
Federal vá se preocupar com aqueles que realmente ameaçam a sociedade.
Essa babaquice de inimigo interno já fez muito mal ao país. Enquanto
calam as vozes do povo, armas e drogas atravessam nossas fronteiras
numa boa. O Rio está infestado delas, e boa parte da culpa é da falta
de fiscalização. No Brasil arcaico do século XXI, as emissoras
privadas de televisão, todas golpistas, ainda recebem dinheiro grosso
do governo (meu, seu, nosso) para veicular campanhas publicitárias de
saúde pública. Em países um pouquinho mais civilizados isso não é
assim, pois como as emissoras privadas são concessões públicas
(decididas pelo meu, seu, nossos representantes no Congresso),
trata-se de uma obrigação ceder espaço para veiculação de mensagens de
interesse público, sobretudo em relação a epidemias (como, atualmente,
a gripe suína). Isso a Folha não critica. Assim como não vê problemas
na existência de um oligopólio privado na televisão aberta. Justo o
jornal que faz propaganda dizendo-se democrata (”quem lê a Folha
fortalece a democracia”). Deveria ser processado por propaganda
enganosa. A Folha não se incomoda com a SS brasileira, a Sociedade
Sinistra que congrega TV Globo, RedeTV, Band, CNT, SBT e Record. É
como se fosse natural que apenas 6 empresas tivessem o direito de se
comunicar via tv com 191 milhões de pessoas. E, pior, é como se fosse
natural que esse oligopólio se posicionasse, compacto, pela economia
de mercado, pela cultura enlatada, pela política coronelista (Sarney
foi “descoberto” com 30 anos de atraso), pelo imperialismo e pela
exploração das riquezas e do povo brasileiro. É isso que veiculam,
todos os dias, e, se discordam, desafio qualquer diretor de qualquer
uma dessas empresas para um debate público, de preferência veiculado
em cadeia nacional de rádio e televisão. Eis a dupla desgraça
brasileira. Um sistema de comunicação apátrida, a serviço do
capitalismo internacional, e um governo – eleito pelo povo e pelos
movimentos sociais organizados – que não se livra disso.



Marcelo Salles, jornalista, é coordenador da Caros Amigos no Rio de Janeiro

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