terça-feira, 25 de agosto de 2009

Estudos sobre a "diplomacia dos campos" e a "economia do Holocausto" revelam as sutilezas da banalidade do mal

Pesquisa FAPESP -

Mesmo após a “invenção” da banalidade do mal, proposta por Hannah Arendt, é difícil pensar em campos de concentração, atuais ou passados, como espaços nascidos do pragmatismo. Pesquisas recentes, nacionais e estrangeiras, porém, revelam que os campos serviram, acima de tudo, a propósitos práticos de governos totalitários, seja como fonte de trabalho forçado em nome da modernização das sociedades, seja como forma de isolar os elementos considerados “indesejáveis”. Infelizmente, esse não foi um “privilégio” alemão e também aconteceu no Brasil. “Com a prática do genocídio nos campos de concentração, o termo passou a representar o ‘inferno’ que foram os campos nazistas e stalinistas. Essa representação fixou o nosso imaginário, nos impedindo de pensar outros campos de concentração como limbo ou purgatórios, estágios anteriores, mas de passagem para o inferno”, avisa a historiadora Priscila Perazzo, cuja tese de doutorado, defendida na Universidade de São Paulo (USP), com apoio da FAPESP, Prisioneiros da guerra: os “súditos do Eixo” nos campos de concentração brasileiros, acaba de ser lançada em livro (Humanitas/Imprensa Oficial/FAPESP, 384 páginas, R$ 40).

A pesquisadora revela que o internamento de imigrantes alemães e japoneses, no Brasil, durante a guerra, foi pragmático “elemento de negociação de interesses entre o Brasil e os Estados Unidos no campo das relações internacionais” e também uma oportunidade para o Estado Novo reforçar a sua política de nacionalismo extremado, excluindo “elementos indesejáveis” de raças que não fossem brancas ou se mantivessem fechadas em suas comunidades estrangeiras. Embora reconheça a diferença abissal entre os campos de extermínio europeus e os campos de concentração brasileiros, Priscila alerta sobre o que chama de “cilada do imaginário”. “Nós que militamos pelos direitos humanos, muitas vezes insistimos que os campos existiram apenas nas terríveis experiências de Hitler e Stalin. Não podemos cair nessa cilada, porque, nessa luta, não nos cabe dimensionar o sofrimento humano, mas evitá-lo, independentemente de sua intensidade”, pondera. Afinal, o Brasil não apenas recorreu aos campos como foi precoce em sua utilização. Já em 1915 era inaugurado o campo de concentração do Alagadiço, no Ceará, onde mais de 10 mil retirantes da grande seca daquele ano foram internados entre cercas de arame farpado, recebendo pouca comida e sob a vigilância de soldados, procedimento que foi repetido, em versão racionalizada, na seca de 1932 e durante os anos da Segunda Grande Guerra.

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